Abrace: 33 anos

Ética e transparência, como princípio. Transformar dor em amor, como lema. Cura, como objetivo

Publicado dia 22/05/2019 às 15h00min

Em 1º de maio de 1986, nove pais e mães de crianças em tratamento no Hospital de Base de Brasília reúnem-se na residência do casal Roberto Nogueira Ferreira e Maria Angela Marini Vieira Ferreira e fundam a Associação Brasileira de Assistência às Famílias de Crianças Portadoras de Câncer e Hemopatias (Abrace). Recontar esse começo é uma forma de agradecer à sociedade de Brasília que abraçou a Abrace e fez dela um conceito. Recorro-me ao velho e sempre atual bom latim: “Verba volant, scripta manent”.

Pior que o tempo nublar a história é a ação do homem — nestes tempos de pós-verdade — a criar convenientes versões, conferindo-lhes ares de verdades definitivas. A Abrace é um patrimônio imemorial de Brasília. A Abrace é resultado do esforço coletivo, da união de cidadãos de boa ética, desprovidos de segundas intenções. A ideia é ajudar a quem precisa, atuando coletivamente, porque só o nada se produz a sós, o bem-fazer é coletivo. A Abrace faz parte de uma Brasília que deu certo.

A parceria desinteressada com os poderes constituídos faz parte do percurso. Permitam-me citar Joaquim Roriz e Wesllian Roriz. Foram eles que nos cederam a residência oficial do administrador do Guará para ser a nossa Casa de Apoio. Visitem-na e verão no que ela se transformou. Foram eles que, a partir de pleitos da Abrace, levantaram o Hospital de Apoio. Justiça se faça também ao secretário da Saúde de então, Jofran Frejat. Foram eles também que nos cederam o térreo onde a Abrace, com recursos privados, construiu o Hospital da Criança José Alencar. Permitam-me, uma vez mais, fazer justiça à senhora Marisa Campos Gomes da Silva, pelo apoio fundamental nessa obra.

A Abrace pertence à sociedade de Brasília e deve permanecer apolítica. O conceito Abrace é dotado daquela força espiritual, humanista, que move homens públicos e não públicos na direção e no sentido de atender às necessidades reais, concretas e dolorosas das famílias e das crianças portadoras de câncer, ao qual se somam outras patologias clínicas pediátricas de alta complexidade. Se a ação política não atender ao homem, com eficiência e qualidade, qual a razão de ela existir?

Em 1986, os fundadores da Abrace fixaram 10 diretrizes fundamentais, norteadoras de sua ação. Trinta e três anos depois, elas continuam atuais: assistência moral e emocional às famílias quando do diagnóstico; assistência total durante e após o tratamento; assistência financeira e material às famílias carentes; acompanhamento do tratamento das crianças internadas com apoio financeiro, material, social e recreativo; orientação às famílias quanto aos cuidados e procedimentos durante e após o tratamento; busca da melhoria das condições hospitalares, locais de tratamento e internação, medicamentos e equipamentos; assistência às famílias de outras localidades, especialmente nos períodos de internação e altas temporárias; acompanhamento do tratamento de crianças carentes, após alta hospitalar; busca de melhores condições de trabalho para os profissionais envolvidos em todas as fases de tratamento; despertar a sociedade e autoridades governamentais para a enfermidade, possíveis causas e consequências, desmistificando a doença.

Hoje, a doença está desmistificada. Falar em câncer é um avanço social e ele não mais é visto como sentença de morte. Tudo que a Abrace faz, 33 anos depois, cabe nas diretrizes. Abrace, para abraçar e ser abraçada, e foi o que a sociedade de Brasília fez. Primeiro de maio para homenagear os abnegáveis trabalhadores da saúde pública de Brasilia, médicos, paramédicos, enfermeiros, auxiliares administrativos… enfim, todos aqueles que, no Hospital de Base de Brasília da década de 1980, acolheram mães, pais e crianças com o carinho de sempre, a dedicação de sempre, o amor de sempre.

Ao Hospital de Base de Brasília, de ontem, hoje e sempre, o reconhecimento da Abrace e a nossa eterna gratidão. À sociedade de Brasília, aos voluntários, aos colaboradores anônimos, aos profissionais da medicina em todos os níveis, o nosso respeito e o nosso amor incondicional. À imprensa escrita, falada e televisiva de Brasília, o nosso muito obrigado.

Quando o destino nos surpreende, só nos resta surpreendê-lo. E o destino, redimido, quis que Maria Angela Marini, fundadora da Abrace, estivesse na sua presidência na comemoração de seus 33 anos. Afinal, a criança de seis anos, gênese da fundação da Abrace, hoje é uma jornalista profissional de 39.

Este texto foi uma homenagem ao aniversário da Abrace, escrito por seu primeiro presidente: Roberto Nogueira Ferreira